domingo, 24 de junho de 2012

Modernismo 1ª fase


Brás, Bexiga e Barra Funda - Antônio de A. Machado
Análise da obra

Alcântara Machado publicou Brás, Bexiga e Barra Funda, em 1927, sendo sua segunda publicação. A obra, da primeira fase do Modernismo, tem, ao invés de um prólogo, um artigo de fundo e o autor confessa que os contos não nasceram contos, mas sim notícias. Alcântara Machado busca fixar tão somente alguns aspectos da vida quotidiana dos novos mestiços nacionais e nacionalistas. Seu processo lingüístico é imitável, inimitável é o espírito, o estilo, animado por uma verve, uma graça e um humor absolutamente pessoais.

Estrutura

O livro é montado através de pequenos quadros sobre o cotidiano pobres de São Paulo, juntando episódios de rua, que o próprio autor intitulava de “notícias”. São 11 contos da mais bem-humorada prosa cubo-futurista, onde vai juntando quadros urbanos que ficam entre a crônica, a notícia e o conto leve.

É possível estabelecer uma aproximação entre Alcântara Machado e Lima Barreto pela atitude jornalística de ambos e pela preferência na retratação do proletariado — os filhos dos carcamanos, no primeiro, e o homem do subúrbio, no segundo.

Os contos mantêm uma característica fundamental do gênero que é a densidade. Todos são curtos e apresentam os elementos mínimos indispensáveis, sem alongar-se em qualquer descrição de cenário ou de personagem. Apresenta apenas os dados essenciais para que a narrativa possa ancorar no espaço desejado, valorizando o mapeamento da cidade, por isso, são freqüentes as citações de nome de ruas e de bairros.

Espaço / Tempo

O espaço é essencialmente urbano, com suas dificuldades e com a luta das pessoas para nele se adaptarem. Podemos dividi-lo em espaço interno, fechado, mostrando as pessoas em casa, no seu viver cotidiano, seja numa condição não muito comum, como o velório, seja na rotina diária, como uma refeição ou conversação informal.

O tempo é cronológico e alguns contos apresentam unidade de tempo, como: Lisetta, Corinthians (2) x. Palestra (1), O monstro de rodas, Armazém Progresso de São Paulo, desenvolvendo-se a ação num só dia. Outros contos, porém, já não apresentam essa unidade, com a ação alongando-se por mais de um dia, numa seqüência revelada de modo elíptico, muitas vezes representado simbolicamente pela duplicação do espaço em branco, que separa um parágrafo do outro, uma ação da outra, num corte cinematográfico. Exemplo disso são os contos: Gaetaninho, Carmela, Tiro-de-guerra 35, Amor e sangue, A sociedade, Nacionalidade.

Foco narrativo

Narrado em 3ª pessoa a modernidade se revela através do jogo de fragmentos, reunindo lances da vida urbana de imigrantes e paulistas tradicionais numa cidade em franco progresso. Entre os elementos mais destacadamente modernos do livro, está a sua forma narrativa, feita em blocos, que funcionam como cenas.

O principal processo narrativo em Brás, Bexiga e Barra Fundaé o diálogo — o diálogo ponto de vista da narrativa, o diálogo revelador de caracteres e o diálogo sugestão de ambientes, ou ainda o discurso indireto vivo, uma forma de dialogação polifônica.

No conto Gaetaninho, esses processos realizam-se através da libertação da construção tradicional da frase e do aproveitamento da vivacidade do coloquial, na visão do menino que brinca, é castigado, sonha com a morte da tia só para andar de carro e morre atropelado.

Linguagem

Quanto à linguagem  propriamente dita, ela é o elemento igualmente central do caráter moderno do livro. Uma das marcas de Brás, Bexiga e Barra Funda é a leveza conseguida por meio do discurso direto, predominante na obra. As personagens têm a oportunidade de falar diretamente por meio dos diálogos, exprimindo suas emoções, tristezas e esperanças com toda a carga expressiva e a coloquialidade que lhes é característica. Os diálogos propiciam também maior sensação de realismo e de proximidade entre personagens e leitor. A história ganha em dinamismo e, graças à sutil ironia de Alcântara Machado, em humor. Além do mais, a leitura dos 11 pequenos contos reunidos nesta obra faz que sintamos o processo de abrasileiramento do italiano.

Antônio de Alcântara Machado traz na linguagem uma marca muito própria dos modernistas da primeira geração: a recusa à linguagem empolada, retórica, cheia de volteios. Ao contrário sua linguagem é marcada pelo estilo telegráfico, conciso. As frases são na sua maioria formadas por orações coordenadas e curtas, garantindo sempre um mesmo ritmo ao texto:

Foi-se chegando devagarinho, devagarinho, devagarinho. Fazendo beicinho. Estudando o terreno. Diante da mãe e do Chinelo parou. Balançou o corpo. Recurso de campeão de futebol. Fingiu tomar a direita. Mas deu meia volta e varou pela esquerda porta adentro.

Personagens

Os personagens são “planos”, superficiais, não apresentam transformações surpreendentes durante a narrativa. As personagens são apresentadas de modo sumário e rápido, embora não seja uma caricatura, apesar do humor. Alguns são verdadeiros tipos como Carmela e Salvatore Melli, mas outros também apresentam uma base psicológica como Gaetaninho.

Na busca pela adaptação cultural e econômica, encontramos as costureirinhas curiosas pelo mundo do qual não fazem parte, mas conscientes de que devem continuar a fazer suas famílias na colônia, as crianças vítimas do preconceito, da pobreza e da injustiça que cerca o imigrante de classe mais baixa, os comerciantes gananciosos e suas famílias buscando uma posição social, os jovens trabalhadores e apaixonados, os quatrocentões paulistas, nobres e falidos, diante dos “carcamanos” endinheirados e “sem berço”.

Problemática e temas principais

Os temas mais recorrentes nos contos da obra em análise são:

1. A luta do Italiano pobre para conseguir seu dinheiro (Tiro-de-Guerra nº 35, Nacionalidade).

2. Ascensão social do italiano (Notas Biográficas do Novo Deputado, Nacionalidade).

3. Integração do italiano com o brasileiro (A Sociedade).

4. O despreparo da cidade e dos adultos com relação à criança que não tem um espaço adequado nem uma atenção necessária, quebrando a cara e a cabeça (Gaetaninho, O Monstro de Rodas).

5. Crítica social — Embora tenha avisado no “artigo de fundo” que não faria crítica ou denúncia social, podemos dizer que não é verdade, embora não o faça como narrador, mas coloca na boca das personagens várias pílulas críticas como em O Monstro de Rodas, quando alguém comenta: “Não conhece a podridão da nossa imprensa. Que o quê, meu nego. Filho de rico manda nesta terra que nem a Light. Pode matar sem medo. É ou não é, seu Zamponi?”

6. Obra datada — Sua obra fica prejudicada por determinadas técnicas que tornam a obra muito datada, dificultando para os leitores jovens de hoje a sua total apreensão. Algumas dessas técnicas são:

— emprego de gírias que já foram esquecidas (estava achando um suco = achava muito bom);

— nome de produtos que deixaram de ser fabricados (cláxon);

— o mapearmento da cidade de São Paulo (Rua do Gazômetro, Rua do Oriente);

7. Nomes de firmas ou de lojas que deixaram de existir (vestido do Camilo, Ao Chic Parisiense);

8. Referências a fatos ou acontecimentos que desapareceram da memória de quase todo mundo.
Alcântara Machado nasceu dentro do espírito modernista de 1922. Em 1927, publicou uma seleção de pequenos contos que batizou com o título de Brás, Bexiga e Barra Funda. Os 11 contos que compõem a obra nasceram da experiência do autor como jornalista e, portanto, apresentam o sabor da notícia. Como cenário, tem três bairros paulistanos, nítida ambientação ítalo-brasileira.  O autor defende a tese de que alguns imigrantes, principalmente o italiano, trazem em si a alegria, o canto e a movimentação. Ao pisarem o solo brasileiro, carregam a força do trabalho e a vontade de se saírem bem na nova terra. Ao se adaptarem, misturam-se de forma espontânea, a ponto de se confundirem com a paisagem. Os personagens, moços e moças, adultos e velhos são captados de maneira singela, revelando com traços estilizados seus jeitos de ser, pensar, viver, que influenciarão definitivamente a cultura paulistana. Alcântara Machado observa-os como um repórter, denominando-os de "novos mestiços", fixando aspectos da vida, do trabalho e do cotidiano dessa gente simples, simpática, aberta e batalhadora. Cada conto se transforma em flashes dos bairros registrados e o enredo, jornalisticamente, vai-se transformando em crônicas da cidade durante a década de 20. A obra apresenta excelente investigação da influência que o imigrante trouxe inclusive para o linguajar paulistano, revelando no autor o artista consciente de que o literato é também um historiador, ao observar a realidade urbana que o cerca.
A SEGUIR RESUMO DOS CONTOS
Gaetaninho - Gaetaninho era um menino dos mamalucos formado. Era pobre, muito pobre. Andava de carro só em interro ou casamento. Sonhava estar andando de carro. Era apenas um sonho. Sonho difícil de se realizar graças à pobreza. Um dia jogando bola Gaetaninho foi atropelado por um bonde e morreu. No bonde vinha seu pai. Agora o que era sonho se tornara realidade. Gaetaninho agora andava de carro. E no carro da frente, dentro de um caixão fechado com flores pobres por cima.
Carmela - Carmela e Bianca saem juntas do serviço. Carmela é linda e possui um lindo corpo. Ela é admirada por todos que passam por ela. Bianca é estrábica e feia e, por isso, é apenas a sentinela da companheira. Carmela, porém, não gosta de ser admirada como é. Bianca adoraria ser, mas não é. Os únicos homens que chegavam para conversar com Bianca era para perguntar algo ou mandar algum recado para a amiga. Como um rapaz chamado por caixa-d’óculos pede a Bianca que avise a amiga que ele a espera às oito horas atrás da igreja Santa Cecília. Bianca avisa. Carmela da uma de durona mas vai. No encontro caixa-d’óculos convida Carmela a um passeio de carro. Ela só aceita na condição de que Bianca vá junto. Os dias passam e Carmela agora diz a Bianca que nos próximos passeios ela não irá junto por pedido de caixa-d’óculos. Bianca se irrita. Bianca quando nervoso rói as unhas todas e sai. No passeio encontra Ernestinha. Esta pergunta, a Bianca sofre o Angelo companheiro de serviço de Bianca. Esta diz que é pra casar. Ernestina se assusta
Tiro de Guerra n* 35 - No Grupo Escolar da Barra Funda, Aristodemo Guggiani ficou sabendo que o Brasil foi descoberto sem querer e que é o país maior, mais belo e mais rico do mundo. O professor Seu Serafim fazia, no final da aula, os alunos contarem o hino nacional e o da bandeira. Quando o sinal batia o pessoal saia vaiando Seu Serafim. Aristodermo saia da escola e ia para a oficina mecänica do cunhado. Era um moleque danado. Entre suas encrencas a mais marcante foi quando quase morreu afogado no Tietë. Aos 20 anos brigou com o cunhado e foi ser cobrador numa Companhia de Autoviação que fazia a linha Praça do Patriarca-Lapa. Logo arrumou uma namorada seria feito, no seu emprego, um sorteio para escolha de defensor da pátria. Para escapar do sorteio, Aristodemo ostentava agora a farde de soldado de tiro-de-Guerra n*35. Lá ele era a base da Segunda esquadra e foi escolhido para ser ajudante-de-ordens do Sargento Aristóteles Camarão de Medeiro natural de São Pedro do Cariri. Seu primeiro dever era saber o hino nacional de cor. Foi aí que deu valor em Seu Serafim, o professor da Antiga Escola. O Segunda dever era ensaiar o hino com toda a esquadra. Durante o ensaio um descendente de alemão sorria em vez de cantar como todos. Disse que não contava porque não era brasileiro e levou um tapa na cara dado por Aristodemo que ensaiava à esquadra o hino. O Sargento ao saber, disse apenas que ouviria testemunhas e iria proceder como fosse de justiça. A justiça foi feita e beka dizia: O Alemão era desligado do tiro-de-guerra e Aristodemo apenas suspenso por um dia. O Alemão desligado por falta de nacionalidade e Aristodemo suspenso por um dia por falta de respeito em relação ao tapa dado no Alemão Aristodemo, sob conselho do sargento, achou melhor sair do tiro-de-guerra e hoje trabalha na Sociedade de transportes Rui Barbosa Ltda na mesma linha da Praça do Patriarca-Lapa.
Amor e Sangue - Grazia não queria mais falar com Nicolino. Por mais que ele tentasse ela não queria mais saber dele. Ainda esperançoso foi até o barbeiro cortar o cabelo e fazer a barba para ver se, mais bonito, reconquistava seu amor. No barbeiro ficou sabendo que um jovem matara uma moça por um amor não correspondido. Achou bandidajem tudo aquilo, não amor. Saiu do barbeiro e topou com Grazia. Ela não queria mesmo saber dele. Nicolino ameaçou até se matar, mas nada dela voltar a falar com ele. Foi então que ele voltou aborrecido. Mais tarde quando Grazia conversava com Rosa, Nicolino veio conversar com ela (ou tentar pelo menos) pela última vez pedir que ela voltasse com ele. A tentativa foi de novo em vão. Então foi, que, com uma punhalada ele a matou. Disse ao delegado que só matou porque estava louco e porque era um desgraçado. O estribilho do Assassinato por amor causou furor na zona.
A Sociedade - O filho de Salvatore Melli chamado Adriano Melli namorava Teresa Rita filha do conselheiro José Bonifácio cuja esposa não gostava nem um pouco do namorado que a filha arrumara. Um dia Salvatore melli e o Conselheiro José Bonifácio fizeram um ótimo negócio juntos. O negócio fora tão bom para ambas que logo seus filhos casaram um com o outro e a mulher do Conselheiro que era contra se apegou com o genro e passou a gostar dele, formando um forte laço de amizade.
Lisetta - Lissetta entrara no bonde com Mariana, sua mãe. Logo notara um ursinho, um lindo ursinho nos braços de uma menina rica. Ficou encontada. Quis tocá-lo, a menina percebendo abraçou com força o ursinho. A mãe da menina rica achou ruim e nem respondeu ao pedido de desculpas de Mariana. Lisetta começou a chorar por querer apenas tocar no ursinho e não poder. Ao chegar em casa Lisetta apanhou bastante de Mariana pela vergonha que causara. Seu irmão Ugo deu-lhe um pequeno ursinho, ela de alegria correu para o quarto e fechou-se por dentro com o ursinho que ganhara do seu irmão.
Corintians(2) VS. Palestra(1) - Miquelina fora até o Palestra Itália ver seu time do coração, o Palestra, jogar contra o rival Corintians. Queria também e torcia para que o astro de seu time, o Rocco, humilhasse o astro Corintiano chamado de Biagio. Mas o que vira foi totalmente o contrário. Seu time perdia por um gol a zero e seu astro Rcco faltando oito minutos para o termino da partida fez penalti em Biagio e o Corintians ganhou o jogo por dois gols a zero. Miquelina saiu de campo nervosa e nada queria.
Notas Biográficas do Novo Deputado - Juca recebera uma carta do administrador da Santa Inácia e, por ela, soube que o pai do seu afilhado Gennarinho, o compadre João intaliano havia morrido de uma anemia nos rim. O administrador perguntava ao patrão o que fazer com a criança. Junto de sua esposa, Dona Nequinha, resolveram trazer o menino para morar com eles. Tratavam dele como um filho e gostaram dele. Gennarinho tinha nove anos e causava admiração em Dona Nequinha por sua esperteza. Só não gostavam do seu nome e o traduziram ficando Januario. Depois resolveram se preocupar com o futuro do menino. Colocaram-o na escola do Ginásio de São Bento. O Reitor do Colégio perguntou o seu nome inteiro, ele, com pressa, respondeu: Januário Peixoto de Faria e foi para o recreio.
O Monstro de Rodas - Morrera uma criança. Uma menina pequena. Durante a caminhada para o enterro mulheres choravam, homens também choravam. Crianças brincavam e faziam apostas. Fora enterrada. De volta para casa olharam para o retrato que publicaram na Gazeta. Pelo retrato admiraram sua beleza, mas de mais nada isso adiantava. O pai tinha ido conversar com o advogado.
Armazém Progresso de São Paulo - O armazém do Natale era célebre em todo o Bexiga por causa das ofertas que fazia dizendo que dava um conto de réis a quem provasse que na sua venda não tinha artigos de todas as qualidades. O filho do doutor da esquina brincava com Natale sobre a oferta tentando achar algo que o arma’zem não possuía. Ele marcava tudo o que comprava na conta do pai só com pseudönimos. O armazém tinha crescido nos últimos tempos graças ao trabalho forte dele e sua esposa a Dona Bianca que suava firme na cozinha. Certo dia Dona Bianca fora servir um eliente por nome de José Espiridião e este meexera com ela. Correu a contar ao marido. Este ao ir conversar com Espiridião fora tapiado na mudança da conversa para o aumento do preço da cebola. Natale voltou para a esposa e perguntou se tinha cara de idiota. Esta fora dormir se vendo no palacete mais caro da Avenida Paulista.
Nacionalidade - O barbeiro Tranquillo zampinetti era bem tranquilo. A tarde sentava junto a sua esposa na calçada e falavam somente na Itália. O único desgosto, que sentiam era esse. Saudades da terra natal. Ia dormir com a idéia de voltar à pátria na cabeça. Ele era proprietario de vários prédios em São Paulo. Chorou como uma criança o Bruno se formou bacharel em Ciëncias Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de São Paulo. O primeiro serviço profissional do Bruno foi naturalizar brasileiro Tranquillo Zampinetti, cidadão italiano residente em São Paulo.




Nenhum comentário:

Postar um comentário